As manifestações culturais do RN foram contempladas em editais da LAB. Foto Reprodução/SSP

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Lei Aldir Blanc: Estado e 147 municípios receberam recursos. Desafio agora é cumprir prazos

Governo do Estado do Rio Grande do Norte recebeu R$ 32.128.654,90 e os municípios o valor de R$ 26.169.928,99.

29 de novembro de 2020

Cinthia Lopes

O Governo Federal anunciou na última sexta-feira (dia 26.11) a conclusão dos repasses para estados e municípios dos recursos emergenciais da Lei Aldir Blanc (Lei emergencial nº 14.017/2020) transferindo a responsabilidade agora para os entes federativos. Apesar do prazo exíguo para cumprir todas as etapas até a prestação de contas, algumas cidades tem se mobilizado em força-tarefa para cumprir prazos, no momento a data-limite é 31 de dezembro.

Segundo dados da Subsecretaria de Gestão de fundos e Transferência, o Governo do Estado do Rio Grande do Norte recebeu R$ 32.128.654,90 e os municípios o valor total de R$ 26.169.928,99.  O engajamento no RN foi acima da média: Dos 167 municípios potiguares, 147 pleitearam e receberam recursos da LAB, ficando de fora apenas 20 cidades. Dentre as localidades que não foram atrás ou não conseguiram cadastrar seus planos de ação está Monte das Gameleiras, localizada na região da Borborema, agreste potiguar.

Devolução

Apesar do bom índice de participação, muitas cidades estão com dificuldades para colocar em prática o plano de ação. É o caso de Macaíba, que recebeu do governo federal 572 mil reais, mas não publicou editais e chamadas públicas, a um mês para prestação de contas. “Estamos desde o dia 16 de setembro correndo atrás da gestão, fazendo reunião, chegamos a enviar um modelo de plano de ação de vários estados e a reunir os segmentos em editais, mas até agora nada foi encaminhado”, comentou uma artista macaibense. Macaíba publicou até o momento o Decreto da Lei e um decreto para os espaços habilitados entregarem seus documentos. Mas não foi além. O TL ainda não conseguiu contato com o secretário Marcelo Augusto. 

Os municípios que desistirem ou não cumprirem os prazos, terão de repassar o recurso para a conta do Governo do Estado, que poderá realizar uma segunda fase de editais e premiações para utilizar a sobra tanto em projetos já inscritos como um edital emergencial para quem ficou desassistido nas cidades desistentes.

A produtora Danielle Brito participa como consultora da Lei Aldir Blanc em vários municípios

O TL conversou com a produtora de cultural Danielle Brito, especialista em gestão pública pela UFRPE/MinC/Fundaj e Mestre pela Universidade de Coimbra (Portugal) em Política Cultural Autárquica. Ela vem acompanhando a Lei Aldir Blanc e analisando dados, além de prestar consultoria para vários municípios do Rio Grande do Norte e um em Pernambuco na gestão dos recursos da LAB.

Danielle está vendo de perto os desafios de gerir esses recursos em tão pouco tempo. O volume de trabalho, prazos apertados e equipes pequenas podem colocar em risco a chegada desse dinheiro na mão de trabalhadores e trabalhadoras da cultura. “Acho que vou passar o réveillon na frente do computador”, comentou. Ela lembra que já existem pedidos de prorrogação da Confederação Brasileira dos Municípios e uma emenda parlamentar tramitando, mas o Ministério do Turismo ainda não se posicionou.

Sobre os prazos e gargalos da Lei Aldir Blanc, Danielle cita o caso de Natal, que foi ágil no cadastramento e publicação das chamadas públicas, entretanto está sentindo o volume de processos, o que explica os atrasos recentes.  Confira a entrevista:

O governo federal encerrou os repasses da Lei Aldir Blanc e passou a “batata quente” para os Estados e municípios, na responsabilidade de pagamento e prestação de contas. Quanto tempo de fato tem os municípios e o Governo do Estado tem para prestar contas do repasse?

Danielle Brito: No meu entendimento os municípios devam prestar contas ate 31 de dezembro, pois finaliza o prazo de execução. Evidente, que algumas coisas só deverão ser concluídas em 2021, por exemplo, as contrapartidas dos beneficiários do Inciso II (Subsídio aos espaços culturais, coletivos, grupos, pontos de cultura, etc) só poderão ser escutadas após o decurso do Decreto de Calamidade pública do Governo Federal.

Existe alguma mobilização das cidades para prorrogar este prazo?

DB: Existe sim, além dos entes federativos, já existe uma emenda parlamentar da Deputada Jandira Fegali que solicita isso, mas não sei se foi para a frente na Câmara Federal. A própria Confederação nacional dos municípios já encaminhou oficio nesse sentido. Também a prefeitura do Natal entrou com um pedido, mas não se sabe se houve resposta positiva.

Você tem acompanhando desde o início os tramites da lei Aldir Blanc e inclusive presta consultoria para algumas cidades. Quais as dificuldades mais comuns?

DB: A maior dificuldade no caso dos municípios é a equipe muito pequena, e se não existe um fluxo corrente entre o setor jurídico, controladoria e financeiro, a coisa anda mais devagar. Porque, nos municípios em que estou atuando não existe um setor jurídico próprio, e a demanda desse setor é grande. Em dois deles houve um fluxo excelente, ou seja, os setores trabalharam juntos e as coisas fluíram muito bem. E mesmo o período eleitoral  não chegou  a atrapalhar o processo.

É possível projetar quanto será devolvido ao estado, no caso do RN?

DB: Os números do Estado são difíceis de prever, porque até para se saber quantos foram habilitados e inabilitados em cada edital eles não colocam na publicação. Aí você tem que contar um a um, página por página. Fiz isso no edital 11/2020. Neste caso do edital, houve 205 habilitados para 370 propostas. Aqui, já se vê uma sobra em torno de 45% de vagas. Não vou falar em recurso, porque os valores são diferenciados, e na habilitação eles não separam por categoria.

Mas acredito que no caso do Estado o pipoco de sobra de recurso venha a ser razoável, para nosso Estado, que é pequeno e nunca teve tanto num período tão curto. Até agora só 621 pessoas receberam a Renda Emergencial. Se formos computar apenas 600 reais por 5 meses, chegamos ao número de 1.863.000,00 (lembrar que mulheres mães que comandam seus lares recebem 1.200 por mês - de novo não se sabe nada- este total pode ser maior). Por isto suponho que para chegar aos 3 mil beneficiários postos no Plano De Ação, o segundo lote deva ter perto de 2.400 pessoas, creio não ser a realidade. Se for menos que isto, teremos muita grana sobrando no Inciso I. E foi pensado algo sobre isso? Não sabemos.

No caso de Natal, como você avalia?

DB: No caso da prefeitura do Natal, um fato há de se notar, foram ágeis no cadastramento dos beneficiários do Inciso II, mas o pagamento está sendo lento. Do mesmo modo os pagamentos dos projetos do Inciso III que não saiu até hoje. Então podemos deduzir que o gargalo apertou, e onde, não sabemos. Ou na Funcarte, na hora de solicitar o pagamento, ou na Controladoria com um volume imenso de processos. Mas, que existe, existe.

Para os editais que ainda estão sendo lançados?

DB: Eu não consigo imaginar como serão os 2 mil processos para serem iniciados na Fundação José Augusto. Eu não consigo imaginar o tamanho da aflição. Sim, porque sabemos que existem nestes locais pessoas que estão trabalhando muito. Eu com meus pequenos municípios, acordo todo dia às 5h da manhã e vou dormir às 22h, e de quebra ainda me ponho na madrugada a pensar...As estruturas de ambas deveriam ter sido incrementadas. Mas é o que temos.

Sobre os editais e chamadas, como você avalia o impacto que terão para o Estado e as cidades?

Todo investimento em cultura é ótimo. Claro que aqueles que envolvam mais de uma pessoa é melhor ainda. Por exemplo, a publicação de um livro, uma realização audiovisual, uma montagem teatral, uma exposição, envolve mais alguém da cadeia produtiva e o dinheiro circula. Eu ando reclamando bastante, para mim mesma, e questiono porque os elaboradores de projetos não foram contemplados com uma chamada pública? No caso do estado, poderia ter determinado um numero X de projetos a serem elaborados e voltados para os municípios carentes desse profissional. Aí nós estaríamos incluídos com nossa mão de obra. Tinha edital para formação, ou seja, seríamos oficineiros. Mas a contribuição poderia ser mais efetiva se tivéssemos auxiliado na ponta. Tem gente elaborando, tem. Mas, será que está sendo colocado seu serviço na planilha de custos?