Jolian Joumes, Carlos Suassuna, Chico Bethoven e Silvio Franco lançam trabalho autoral após 25 anos
Reportagens
Com 26 anos de carreira, banda lança EP e videoclipe dia 3 de outubro, nas plataformas digitais
20 de setembro de 2020
Por Cinthia Lopes
“Afinar o tambor no calor da fogueira, dançar o zambê e saber da história”. O verso de “Quilombola Sibaúma”, que marca o retorno do veterano grupo Alphorria ao trabalho autoral em 2020, descreve a expressão cultural mais forte do litoral sul, trazida pelos africanos escravizados nas fazendas de açúcar da zona da mata potiguar. São batuques e danças transmitidos de pai para filho como símbolo de resistência de suas raízes, que ainda permanecem vivos na região de Tibau do Sul. E agora inspiram e ecoam no primeiro videoclipe da banda potiguar.
“Quilombola” foi lançado dia 3 de outubro nas plataformas digitais junto com o EP homônimo, que teve um pré-lançamento em janeiro, mas a pandemia inviabilizou sua divulgação mais consistente e a sequência de shows prevista.
O clipe ressalta a força do negro na formação cultural da região, desde Sibaúma e Negros do Riacho, outra comunidade de Currais Novos, aos jovens desta geração que vivem nas comunidades menos favorecidas, todos guerreiros de seu tempo. Enquanto a letra conta como esses guerreiros atravessam o mar e sobreviveram nos quilombos que se transformaram em favelas e periferias, e assim mesmo criando e produzindo com orgulho.
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Dirigido por Carito Cavalcanti e Fernando Suassuna, que também assinam roteiro e edição, o clipe teve locação principal na comunidade da África, localizada na Redinha, no galpão ocupado por artistas do grafite e do rap e por atletas, conhecido como Novos Valores. A banda se ambiente ao espaço junto com artistas do lugar dando um tom dinâmico, real e pulsante. Chico Bethoven está muito bem nos vocais principais e a participação marcante dos rappers Koala e Breno Slick, da banda Time de Patrão, valorizam o discurso mais atual. Há ainda imagens raras de domínio público do filme documental Africa Speaks (África Fala), do americano Walter Futter (1930).
A letra e os arranjos foram compostos de forma coletiva pelo atual quarteto Jolian Joumes (baixo e voz), Carlos Suassuna (guitarra), Chico Bethoven (sax, flauta, percussão e voz) e Silvio Franco (bateria e percussão). “A gente faz referência a quilombolas espalhados pelo Brasil, em especial a Sibaúma e o coco de Zambê, ritmo e dança nativo daquela comunidade. Sem deixar de situar a luta do negro em meio ao contexto social que vivemos atualmente”, contou Chico Bethoven, em conversa com o TL.
Segundo Bethoven, a crise da pandemia também inviabilizou de gravar o ritual de Zambê realizado em Tibau do Sul na lua cheia, quando os mestres e brincantes dançam e cantam ao redor da fogueira. Para Carito foi um desafio, mas ficaram satisfeitos com o resultado. "Tivemos total liberdade e fizemos uma investigação de linguagem moderna para dialogar com o universo do reggae em fusão com o universo dos rappers e hip hop, procurando traduzir a mensagem e temática da letra nos caminhos estéticos escolhidos", comnentou
.O clipe teve o patrocínio do governo do Estado através da Fundação José Augusto, pelo edital de fomento a cultura potiguar 2019. Já o EP foi feito com recursos próprios.
Os rappers Koala e Breno Slick emprestam um pouco de suas rimas atuais a letra de "Quilombola"
A mistura de ritmos ao reggae do Alphorria não é de agora. No passado teve o repente, agora tem o rap. “Apesar do Alphorria ser uma banda de reggae, sempre buscamos inserir elementos regionais. Desde o começo tem alguma coisa de Raga e rap no nosso som. Dessa vez convidamos o pessoal do Time de Patrão pra fazer esse som com a gente. Eles mandam muito bem”, valoriza.
O EP com cinco músicas reflete uma atualização da sonoridade e letras, sem perder o elemento pop dos tempos de Malandrinha e afins. Das atuais parcerias, Time de Patrão está além de “Quilombola” em “System base of life” (Bethoven, Juliano Julius), que mistura letra em inglês e português para falar da condição atual do povo brasileiro. O músico e compositor Gustavo Lamartine (DuSouto/General) comparece com “Rasta Pé”, letra que brinca com as conexões do rasta da Jamaica e o arrastar das sandálias do forró nordestino.
Clipe reforça a importância do negro na formação cultural da região
Em “Iêmãejah”, de autoria de Henrique Wanderley (Gardelão), há um reforço de percussão marcante com elementos de batuques ancestrais. A parte romântica está presente em “Zen”, de Rodrigo Melo. O disco ainda conta com o auxílio dos metais de Gilberto Cabral (trombone), Laerte Adler (trombone), Kercinho (trompete), Amaro Vandinho (trompete) e Kleber Moreira na percussão.
Trajetória
Foi nos anos 1990 que o reggae brasileiro deixou os guetos e passou a ser consumido pelo público da música pop, a exemplo de Cidade Negra. Como representante da cena local, Alphorria inaugurou também a era dos videoclipes lançando o “Banana Reggae”. O disco de estreia “Alphorria” foi lançado em 1995, contendo os hits “Malandrinha”, de Edson Gomes, “Sonho Rasta”, “Banana Reggae” e “Aponto pro Futuro”. Na época a banda era um sexteto e tinha nos vocais Rildo Lima. O disco colocou a banda potiguar no cenário regueiro nacional, com clipe exibido na MTV e programas como o Videoshow, na Tv Globo. No programa a banda chegou a ser apresentada por Toni Garrido, do Cidade Negra, espécie de padrinho dos potiguares.
“São 26 anos de banda, interrompidos por alguns momentos para realização de projetos pessoais, estamos todos chegando na casa dos 50 anos, que eram 6 no começo e hoje são 4 dos pioneiros”, lembra Bethoven. Ele adianta que daqui pra frente o quarteto irá trabalhar esse EP, tentar produzir mais clipes com essas músicas que são muito boas e deixar o universo conspirar a nosso favor. “Acreditamos na positividade de nossas músicas, de nosso trabalho e acima de tudo, de nossa amizade que desde sempre somos uma família”.
Confira a ficha técnica do videoclipe "Quilombola Sibaúma"
Direção e Roteiro: Carito Cavalcanti e Fernando Suassuna
Edição: Fernando Suassuna
Finalização: Levi Herrera
Direção de Fotografia e Câmeras: Carito Cavalcanti e Justino Netoly, F.Black
Produtora de Vídeo: Praieira Filmes
Ouça também o EP “Quilombola”
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