David Leite é escritor versátil e mantém ativa a prestigiada Sarau das Letras

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David de Medeiros Leite fala sobre novo romance, sua estreia em “mar aberto”

Experiente escritor e criador da editora Sarau das Letras fala sobre romance de estreia 2020 e o cenário atual das letras potiguares

02 de fevereiro de 2021

Por Alexandre Alves

Escritor, editor de livros e Professor de Direito na UERN, o mossoroense David de Medeiros Leite lançou no ano passado um dos poucos romances potiguares nos últimos anos (comparado com a produção norte-rio-grandense na área da poesia, os romancistas são quase escassos). O volumoso 2020 é sua estreia na categoria do romance e vem chamando a atenção por sua narrativa.

Dividindo seu tempo entre as duas maiores cidades do Rio Grande do Norte (a capital e a semidesértica Mossoró) e também se alternando entre poesia – ele ganhou o Prêmio Internacional “II Concurso de poesia em língua portuguesa”, da Universidade de Salamanca (Espanha), por seu livro “Incerto caminhar” (publicado em 2009) –, o autor também surge candidato a uma vaga na Academia Norte-rio-grandense de Letras.

Ou seja, David Leite atua de forma incansável em muitas frentes (crônica, poesia, romance) e mesmo em meio à pandemia mantém ativo o trabalho da editora Sarau das Letras, uma das casas de publicação mais conceituadas no estado. Nesta mini-entrevista, David trata de Literatura, academia, pandemia, romance, o presente, o futuro e o passado, comprovando que está atento a tudo em sua volta.

Entrevista com David de Medeiros Leite

1. Você escreve abrangendo vários tipos de texto literário (crônica, poesia, romance). Como ocorre seu processo criativo? Existe algum tipo de motivo específico para escrever neste ou naquele gênero?

Em verdade, sempre escrevi crônica e poesia, desde 2001 publicando em ambos os gêneros. Em 2020, com o 2020, o romance, estreei na ficção. O trocadilho entre o ano e o título do livro foi inevitável. E existem, sim, diferenças entre criar em um gênero literário e outro. Alguém disse que “escrever crônica é como nadar em uma piscina, pois se enxerga a outra borda; porém no romance é como se a natação ocorresse em uma enseada ou em mar aberto...”.

Exageros à parte, senti nessa metáfora algo de real quando comecei a conceber 2020, pois dispunha de uma ideia e, ao longo da escrita, as braçadas mudaram o rumo da prosa. Enfim, posso resumir dizendo: trata-se de novas experiências e, do ponto de vista literário, devemos sempre experimentar o novo.

 

2. A produção local na área da prosa foi mínima no quesito livro em 2020 nas terras potiguares. Como escritor, como você se sente tendo conseguido lançar um dos poucos romances no RN durante 2020, justamente o título de seu livro e numa área de poucos atuantes no gênero dentro do estado?

O ano de 2020 foi complicado em todas as áreas. Vidas humanas ceifadas pela pandemia, que ainda persiste. Então, em meio a essa tragédia, avaliar o quesito publicação é, também, bastante difícil. Não fiz lançamento do 2020. A edição ficou pronta justamente em maio passado, quando a pandemia já havia começado. Estamos “vendendo” pela divulgação que houve em redes sociais e outros meios eletrônicos. Agora, para a nossa alegria, houve uma crítica literária em torno do romance que despertou interesse na leitura. Creio até que podemos mencionar que existe uma pequena “fortuna crítica” [sobre o livro], com opiniões de consideráveis nomes do universo literário do RN e de outros estados, podendo citar Manoel Onofre Junior e Adelto Gonçalves.

3. Em sua escrita, com certeza, devem existir autores que o influenciam. Quais seriam os nomes de sua experiência como leitor que você recomendaria aos leitores de modo geral e por quê?

Sou machadiano, leitor assíduo de Machado de Assis, e, de outro ângulo, posso citar influências que vão desde Miguel de Cervantes até Umberto Eco. Portanto, minha recomendação seria muito que o leitor lesse: romance, poesia, crônica ou conto. Autores daqui e de alhures. O importante é o hábito da leitura.

Nos dias correntes, temos que admitir um mundo virtual preponderando. Pois bem, seja pelo livro virtual ou impresso (que alguns ainda preferem), faz-se necessário que lutemos, quixotescamente, no sentido de fomentar novos leitores.

4.Atualmente, nas rodas intelectuais, anda se falando em sua candidatura a uma vaga na Academia Norte-rio-grandense de Letras. Como você encara o atual papel que deve ser exercido por uma instituição como ela, já com muito tempo de existência, diante do recente quadro criado pela pandemia?

Alguns amigos, para minha honra pessoal, lembraram nosso nome. Academias e confrarias literárias são necessárias. Faço parte de algumas instituições, citando, como exemplos a Confraria Literária Café & Poesia e a Academia Mossoroense de Letras (AMOL). A Confraria é totalmente informal, já na Academia existe um ritual. Porém, o importante é que mulheres e homens se reúnam para debaterem literatura e cultura. Se há pessoas que se encontram para discutir outros temas que lhes interessam, cabe a quem gosta das letras convergirem num estuário comum.

Quanto ao papel que essas instituições devem protagonizar nesse “novo normal”, teríamos que avaliar o propósito, funcionamento e forma muito particulares de cada uma para propormos algo. De uma forma bem geral, existe uma necessidade de se reinventar, diante de tantos desafios que a urgência e a iniquidade do cotidiano querem nos impor.

5. Como um dos editores da Sarau das Letras – uma das principais editoras locais e já com centenas de títulos lançados nos anos 2000 –, qual a sua visão sobre a literatura potiguar para o período da pós-pandemia? Você vislumbra alguma ação promissora ou diferente?

A Sarau das Letras nasceu de uma união de esforços para se editar o autor potiguar. E, desde logo, quero ressaltar – em nome de Clauder Arcanjo e de todos que compõem o Conselho Editorial – a alegria de alcançarmos 300 títulos publicados nessa jornada de quinze anos. É muito para um selo editorial nascido no interior do semiárido nordestino. Ou de qualquer quadrante brasileiro. Não gostaria de fazer previsões, considerando o momento instável, repito, em todas as áreas.

No entanto, com a vacinação e, consequente retorno à normalidade, voltaremos a circular e a participar de mais lançamentos de livros e de outras atividades do meio literário, dos quais sentimos imensa falta. O movimento literário potiguar, como de outros lugares, terá o desafio de conquistar novos espaços e mostrar valores que surgem a cada dia.