Luan Bates, Jubarte Ataca e Sample Hate lançam trabalhos que valem uma escuta mais atenta

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Distante da "new MPB", (pop) rock potiguar continua vivo e bem!

Em 04 lançamentos recentes rock marcam terreno e se afastam da sonolenta “new MPB” atuante no cenário brasileiro (quase) pós-covid

31 de março de 2022

Por Alexandre Alves
Enquanto parte da diminuta imprensa local gasta seu tempo em nostalgia virtual que faz pouco sentido em um mundo já “youtubeano” ou repete os releases de lançamento de singles da sonífera e modista new MPB que assola o país e os festivais que timidamente vão voltando à tona, o pop rock potiguar (que já passou de seus 50 anos de atividade) marca sua volta mais intensa em um país devastado pela Covid. Eis aqui 04 lançamentos recentes que não podem deixar de ser escutados com a devida atenção.

JUBARTE ATACA, “Das profundezas, emerjo!” (2022, Otittis Media Records, 13 faixas)
O trio mossoroense/natalense Jubarte Ataca é representante único da Surf Music em terras potiguares. E vem passando por cima da concorrência roqueira em geral feito um trator. Se seu álbum anterior foi lançado por um dos mais importantes selos independentes nacionais (a Baratos Afins, de SP), desta vez o power surf trio foi lançado em vinil pelo selo estadunidense Otittis Media Records, com sede no Texas.

No disco, 13 faixas instrumentais vem com aquele talhe californiano tradicional (Dick Dale, Surfaris, Ventures), porém atualizado com um pé no acelerador como nas festivas “Dragão negro” (com várias mudanças de andamento) e em “Peixe demônio”. Por outras vias, a banda desacelera um pouco nas quase românticas “Víbora do Pacífico” – essa dá para dançar no baile de formatura – e “Lula vampira do inferno”, mas causa mesmo arrepios das profundezas na inebriante “Lula de Humboldt”, um arraso para quem gosta do estilo, incluindo a nervosa bateria de Joaquim Dantas. O destaque do trio fica com o guitarrista Diego Cirilo, armado com os melhores timbres do pedaço com sua Fender Jaguar, oh yeah! 

O disco é para tocar e escutar de uma ponta a outra, deixando para o final uma faixa com vocais (desnecessários, cá entre nós) do convidado Paolo Araújo (Moloko Drive, ex-Bugs) em “De volta às fendas abissais”, salvando-se apenas pelo refrão marcante em meio a acordes roqueiros já bem conhecidos, porém distintos do estilo da banda. Compre dois discos e dê um de presente desta banda que faz parte de uma cena de surf music instrumental brasileira que poucos sabem que existe. Daqui do lado de cá dos trópicos, e em vinil colorido em tons de verde e vermelho, eles emergem!
LINK: https://jubata.bandcamp.com/


LUAN BATES, ‘Something else to play” (Nightbird Records, 2022, 05 faixas)
O inquieto jovem do cenário natalense já gravou dezenas de canções de 2015 até agora e se manteve bem ativo durante a pandemia (o rapaz também é o capo do selo indie Ninghtbird). Neste novo EP, o cidadão se arma com banda inteira e une elos opostos, indo do hard rock ao acústico, caminhando com desenvoltura em ambos.
Na sonoridade do lado mais Neil Young/ Dinosaur Jr. da gravação, as faixas “There she is” e “Health to you” mandam riffs e refrões constantes, mas sem se alongar nas diatribes sonoras como os mestres sônicos supracitados. Todavia, quem gosta de alt-country e folk vai simplesmente delirar com os slides da hiper melódica “One kiss”, no melhor estilo Jayhawks de ser, isso tudo em dois minutos de duração (!). Uma verdadeira pérola mundial do estilo escondida nas mãos do garoto Luan Bates, que ainda consegue mandar um recado de otimismo no refrão (“Bright days are yet to come”). E ao vivo as guitarras ganham corpo. Não perca o próximo show deste ainda ilustre desconhecido. Se depender do sujeito Luan Bates, o rock continua a rolar.
Site: https://www.youtube.com/playlist?list=OLAK5uy_kbRAp4x3hCpACFGxy-Gprie3m-DW5Plfg


SAMPLE HATE, “O novo Nordeste psicodélico: volume 01” (2022, Independente, 05 faixas)
Aparentemente cansado da barulheira de seus grupos anteriores, Dante Augusto (ex-Calistoga) vem se lançando junto com Artur Porpino (também do Fukai) em experimentar sonoridades mais ambientais e levemente experimentais. Após terem lançado quase 20 singles de forma virtual entre 2020 e 2021, agora o duo aposta em criar paisagens sonoras flertando com elementos díspares, misturando influências da MPB menos ortodoxa (Tom Zé, Itamar Assumpção, Walter Franco) e agrupando violões, teclados de timbragem vintage, sampleagens, leve percussão eletrônica e vocais em inglês e português. 

Na maior parte do tempo, o clima é praieiro nas cinco faixas, costurando sombras de World Party, John Frusciante e Eddie na quase pop “Fly”, cujo acordeom carrega mais seu lado irlandês do que nordestino. Esta surge mais presente na mistura de música oriental e rabeca presente em “Rabeca jungle” e “Armorial beat”; A pseudo-paraense-com-batida-de-roda-no-refrão de “O fim” é uma vinheta estranha e meia, mas a  derradeira faixa (“Astronautas”) quase esbarra numa sonoridade Los Hermanos e aí a sugerida psicodelia do título do EP desaparece, apenas emergindo fantasmagórica nos vocais beatlesnescos incidentais. No geral, a abordagem das canções ainda parece bem limpa e pop, mas vamos esperar o volume 2 para fazer a conta final.
Site: https://samplehate.wixsite.com/novo-nordeste


TRIVORACTUS, “EP” (2022, Independente, 06 faixas)
Vindo também da desértica Mossoró, o hard rock old school do trio vem com guitarras com riffs constantes (alguns deles dobrados) e mantém a chama acesa do estilo roqueiro setentista. A banda andou lançando três singles ao longo de 2021 e agora as juntou com mais 03 canções inéditas. O resultado é uma sonoridade bem tradicional, sem novidades para os que gostam do estilo.

O diferencial aqui passa pelos vocais em bom português, como na incrementada “A grande ceia”, esta contendo também vários andamentos inventivos de bateria ao longo da canção. Uma sonoridade mais moderna ronda os riffs em espiral de “Circular”, mandando um vocal grave e rasgado ao mesmo tempo nas estrofes, mas no refrão os vocais rondam um tom mais dramático. Certo swing marcam as guitarras de “Hospedeiro”, com lembranças de Grand Funk Railroad. As guitarras bem trabalhadas da densa “Navios negreiros” flertam com o metal melódico devido ao timbre alcançado. 

 

Fecha o EP  a quase balada hard “Tocaia”, mas que na hora do refrão está mais para os paulistanos do Golpe de Estado do que para balada para escutar no verão, chegando a ter momentos de prog rock nas delirantes guitarras oitavadas. E a curiosidade é que o Trivoractus lembra um pouco em certas passagens os parnamirenses d’A Máquina, banda da safra dos anos de 1990 e que recentemente voltou a tocar.

LINK: https://www.youtube.com/watch?v=UakCo72jTZA