Em livro, Falves Silva remonta a história de uma arte que dialogou além das fronteiras
Reportagens
Referência do movimento Poema-Processo reconta a história da Arte Postal através de sua coleção pessoal lançada em livro
14 de dezembro de 2021
Cefas Carvalho
Falves Silva é praticamente um sinônimo, ou para ser mais exato, um símbolo vivo e atuante do movimento Poema/Processo, que marcou época em Natal e além-fronteiras a partir do seu manifesto inaugural em 1967, juntamente com lado de nomes como Moacyr Cirne, Wlademir Dias Pino, Álvaro de Sá e Neide Sá.
Mas o que nem todos que estudam a contracultura potiguar e brasileira sabem ou recordam é que Falves a partir da década de 1970 se associou à rede internacional de Arte Postal, mantendo-se em diálogo com artistas de diversas gerações e nacionalidades que adotavam esse estilo, como, Jota Medeiros (potiguar), Ivald Granato, Leonhard Frank Duch, Paulo Bruscky, Hudinilson Jr, Clemente Padín, Edgardo Antonio Vigo, Ulises Carrión e Horácio Zabala.
A Arte Postal, ou Mail Art, tem elementos caracterizados na troca (verdadeira ou ficcional) de correspondências. São aplicadas técnicas como colagens, fotografia, escrita ou pintura, transformando carimbo, selos, cartão-postal e envelopes em suportes para uma livre expressão. Surgiu nos Estados Unidos e se expandiu pela Europa como uma alternativa aos meios convencionais de exposições de arte em 1960 e, no Brasil, nos anos 1980, se tornou um dos caminhos para protestar diante da censura no período da ditadura militar, tendo sido adotada por artistas da contracultura como Falves, que já se correspondia com artistas desde a década de 70.
Neste sentido, Falves resgata essa história com o lançamento de ‘Bam! Arte Postal’ neste sábado, dia 18, no Mercado de Petrópolis, em Natal, a partir das 10h. No livro, o artista reúne uma série de trocas de correspondências que manteve com artistas em todo o mundo, sendo reproduzidos textos em Português, Espanhol, Italiano, Francês e Inglês. O autor estará presente durante o lançamento e os exemplares do livro estarão à venda no valor de R$50,00.
Segundo Falves, o livro é dedicado aos amigos com os quais manteve uma correspondência produtiva por mais de três décadas, durante os anos 70, 80, 90 até a virada do século 20. “Através da Arte Postal produzimos um diálogo sem fronteiras, uma arte livre de preconceitos estéticos, moral ou filosóficos”, afirma.
QUEM É FALVES
Nascido em Cacimba de Dentro, na Paraíba, em 1943, mora em Natal desde os anos 1960, onde se dedicou á arte, escolhendo o caminho da contracultura. Em 1981 participou da XVI Bienal de São Paulo, com curadoria de Walter Zanini. Tem seus trabalhos exibidos na International mail art exhibition, Tóquio, Japão, em 1984, e na II Bienal de Arte Correio, Espanha, em 1999. Mais recentemente, o artista teve sua exposição individual “Círculo do Tempo”, retrospectiva de sua carreira, apresentada no Centro Cultural São Paulo.
A EDIÇÃO
O editor da obra, o sebista Oreny Júnior, do do Sebo e Selo Literário Gajeiro Curió, fala sobre o trabalho: “Falves é um dos precursores do Poema Processo no Brasil e é uma honra para mim, com o apoio de colegas e parceiros, poder viabilizar esta obra e divulgar, ainda mais, o trabalho esplendoroso de Falves”.
Segundo Oreny, “trata-se de um documento importante sobre a contracultura potiguar e a produção de um de seus maiores artistas”. O projeto gráfico e a capa são do próprio Falves Silva. A diagramação é de José Aglio Neto.
ENTREVISTA: “BAM!”, Um tiro na arte dita convencional
Por Redação
Artista multimídia por natureza, com uma produção agrupando artes plásticas, desenho, poema-processo, arte correio e arte conceitual, o quase octogenário Falves Silva (paraibano radicado em Natal desde criança) vem mantendo sua produção de gravuras, colagens e obras diversas ainda bastante ativa mesmo na pandemia (houve recente leilão no qual foram vendidas algumas de suas peças, por exemplo). A produção constante inclui também sua produção de livros.
Seguindo-se ao livro conceitual “12x9+n=Y”, de 2019, no qual experimentava gravuras coloridas e preto e branco agrupando sua recente produção nos anos 2000 em sua maioria, o inquieto artista lança agora o livro “Bam!: arte postal”, saindo pelo selo potiguar Gajeiro Curió. A publicação consiste em um mosaico montado a partir da correspondência do artista ao longo das décadas de 1970 até chegar aos anos 2000. Dentro do livro figuram – além da produção de Falves Silva – obras e textos de vários artistas que estavam em contato, em especial com a arte correio, movimento de alcance internacional.
Sendo um dos destaques da recente “I Jornada Internacional de Poesia Visual” ocorrida em novembro e promovida pela USP e Casa das Rosas (SP), Falves participou da mesa de abertura do evento e continua mantendo firme sua produção contemporânea. Logo a seguir, ele tenta esclarecer seu novo livro, cujo lançamento será de forma presencial neste sábado a partir das 10 horas no Mercado de Petrópolis no Sebo Gajeiro Curió, com o artista autografando a obra.
Por que o título do livro como simplesmente “Bam!” ?
A experiência com a arte correio me fez perceber que ela era um tiro na arte dita convencional, que hoje somente 50 anos após seu começo tem seu valor realmente reconhecido como parte da produção atual, fazendo parte dos museus e exposições ao redor do mundo. A onomatopeia do “Bam!” veio das HQs, uma de minhas influências e por isso resolvi usá-la, como representação simbólica desse tiro.
O que o leitor verá e lerá dentro do livro, uma vez que se trata de uma obra múltipla?
O livro foi montado a partir das centenas de cartas que guardei através de minha participação na arte correio dos anos de 1970 e 1980. A partir desta correspondência, e dado o fato de que a arte correio é internacional, no livro além de minha produção existem textos e algumas obras de, por exemplo, Clemente Pádin, Paulo Bruscky, Moacy Cirne e outros. Vários textos estão em espanhol, inglês, francês e italiano, compreendendo desde a década de 1970 até adentrar o novo milênio. Estes textos variam de 01 página até umas 08 páginas e não havia intenção minha de traduzir, uma vez que a arte correio é internacional. O livro, no final das contas, é uma grande obra coletiva.
O que existe de sua produção interna no livro?
Olhe, inerente à arte correio, que era basicamente colaborativa e feita de interferências dos artistas entre si – assim como o poema-processo anos antes ainda na década de 1960 –, o que se vê no livro é tudo baseado na minha correspondência na arte correio. Então, tudo parte de uma visão minha, mas em interação com outros artistas. Tudo foi feito a partir disso, por isto digo que o livro, embora com meu nome na capa, é uma grande obra colaborativa, focando a arte correio. Não cheguei a contar, mas dentro do livro deve ter participação entre 40 a 50 artistas diferentes e de várias localidades, como EUA, a antiga Tchecoslováquia, Espanha, Reino Unido, entre outros.
De quem foi a ideia da vaquinha online para ajudar a custear parte da produção do livro?
Essa ideia partir do editor Oreny Júnior, do sebo Gajeiro Curió, que também já tem uma editora com alguns títulos lançados. Como a pandemia atrapalha muito ainda a situação de fazer o lançamento, pois nem todos querem sair de casa ainda, e com razão, foi mais uma forma de viabilizar parte da publicação, pois o livro tem um custo alto devido à impressão mais cuidadosa e pelo número de páginas, que passa das 150. Também foi uma saída para enviar aos interessados de fora do RN e eles conseguirem adquirir o livro.
Por último, o que vem do inquieto Falves Silva em 2022? Algum plano?
Em 2020, eu estava indo lançar meu livro anterior na SP Arte, um dos maiores eventos envolvendo artes de forma geral no Brasil, mas a pandemia cancelou tudo. Como está tudo ainda meio parado, resolvi lançar este livro junto com a editora do Gajeiro Curió para não deixar 2021 passar em branco. Fui convidado para a palestra de abertura da “I Jornada Internacional de Poesia Visual”, ocorrida em novembro último. E recebi a notícia que haverá obras minhas republicadas em um livro que sairá no começo de 2022 pela Universidade de San Diego, na Califórnia, Estados Unidos, tratando de minha participação na revista americana “Cabaret Voltaire”, editada na segunda metade dos anos de 1970 e ligada à arte correio.
SERVIÇO
SERVIÇO
O QUÊ? Falves Silva em lançamento do novo livro “Bam!: arte postal”
QUANDO? 18 dezembro 2021, sábado, a partir das 10h da manhã até 14h
ONDE? Mercado Cultural de Petrópolis (Sebo Gajeiro Curió – Box 41).
VALOR DO LIVRO? R$ 50,00
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