Wilson Simonal foi um dos maiores cantores brasileiros e fez sucesso nos anos 60 e 70
Reportagens
Canções como ‘Tributo a Martin Luther King’ e ‘Faz Parte do Meu Show’ estão entre os registros
03 de julho de 2020
Cinthia Lopes
Se o cantor Wilson Simonal teve um porto seguro em sua conturbada vida, este lugar foi Natal. Na companhia protetora do empresário João Bastos Santana, amigo leal do artista em seus últimos anos de vida, Simonal encontrou nas idas e vindas a Natal um pouco da normalidade após o duro boicote que sofreu por ter sido apontado, nos anos 70, como um “dedo duro” da ditadura militar. Só depois de sua morte nos anos 2000 que a história se revelou diferente daquela que o colocou fora dos grandes palcos. A biografia “Nem vem que não tem”, de autoria de Ricardo Alexandre, foi a primeira a aprofundar o assunto em busca de respostas. Depois vieram o documentário “Simonal: Ninguém Sabe o duro que dei” (Cláudio Manoel, Calvito Leal e Micael Langer) e o longa “Simonal: O filme” (Leonardo Domingues)Mas coube a família e aos amigos o incansável trabalho de recuperar a imagem de Simonal levando o caso à comissão da verdade no Senado federal.
Quando vinha a Natal nos anos 80 e 90 ele se hospedava na casa de João Santana e daqui aproveitava para circular pela região em pequenas casas de shows, como a finada Casa da Música na Praia do Meio. Também era visto na tv local estrelando os comerciais de cestas natalinas São Cristóvão. Na época a São Cristovão era um supermercado de propriedade do empresário João Santana, atualmente é uma sofisticada loja de vinhos comandada pelo filho do empresário Alexandre Santana.
Nessas visitas de Simonal era comum acontecerem serestas na casa do amigo. “Lá em casa não havia boicote ou perseguição, eram festas particulares concorridas por amigos e músicos locais que queriam conhecer, bater papo e levar um som com esta estrela brasileira”, lembra Santana. Foi numa dessas ‘jam sessions’, em 1989, que o empresário aproveitou para gravar canções que à época o artista já incluia em seu repertório. O produtor lembra ter usado um gravador AKAI (aqueles com rolos enormes) com cabeçote de ferrite em fita cassete. Pouco a pouco Santana foi produzindo o material que tinha guardado: A partir da voz original de Simonal inseriu o instrumental e coros com músicos que vieram a Natal e artistas locais.
Com a redescoberta da obra de Wilson Simonal pela nova geração apreciadora de seu original sambalanço, esse capítulo vivido em Natal também ressurge. Pensando nisso João Santana resolveu disponibilizar o material em seu próprio canal no Youtube — João de Simonal. “Foi aqui que Simonal encontrou um apoio incondicional, trilhando uma história pouco conhecida, mas não menos interessante. No canal podem conhecer muitos registros raros, e histórias perdidas do maior cantor do Brasil”, comentou o produtor.
Até o momento foram postadas nove músicas dos 20 clipes previstos. “Conversei com o Max de Castro, filho de Simonal, e ele disse que seria interessante começar a soltar o material no meu próprio canal e observar o interesse do público”.
Desse material constam “Faz parte do meu show”, de Cazuza/Frejat, ‘Lobo Bobo’ de João Gilberto, que contou com participação de Zeca do Trombone, músico carioca radicado em Natal que lhe dava apoio constante. ‘Remelexo’ de Caetano Veloso, que na gravação traz participação de Eduardo Santana, “A Tal Menina”(Simonal), com participação de Franklin Novaes, e o clássico ‘Tributo a Martin Tuther King’, canção de Simonal e Ronaldo Bôscoli composta em 1967 para homenagear o líder da luta pelos direitos civis e igualdade racial.
Simonal em um das serestas na casa de João Santana, em Natal. Um pouco de normalidade em tempos de ostracismo. Foto: Cedida
“Negona” de Luiz Vagner, com Eduardo Santana ao piano e Zeca do Trombone no sopro é uma das músicas que Simonal gravou do artista. Tem uma história sobre eles dois contada por Santana: "Luiz Vagner é um dos expoentes da cena black brasileira e já tinha cedido pra Simonal a canção Embrulheira, que em seus versos continha a frase 'Essa foi demais/Estou sabendo, vão rasgar o meu cartaz’, versos que já ironizavam a dura fase de perseguição e boicote que Simonal sofreu". Também estão disponíveis “Papel Machê” (João Bosco) e “Bandeira do Divino” (Ivan Lins e Victor Martins).
É possível notar a voz já frágil de Simonal. Os arranjos trazem bastante coro em todas as gravações e Santana explica que usou o recurso para preencher justamente as lacunas das falhas na voz de Simonal, que já não era a mesma de antes. “Ele tinha muitos problemas de saúde que afetaram suas cordas vocais, como a cirrose”.
A versão de ‘Tributo a Martin Luther King” traz a fala original da apresentação ao vivo na Roquete Pinto, que já existia no Youtube. A música foi gravada pela primeira vez em 1967 e lançada em compacto pela gravadora Odeon, com grande sucesso popular e de crítica. Também foi gravada ao vivo no mesmo ano durante a entrega do Troféu Roquete Pinto para os melhores do ano. Simonal resolveu cantar Tributo, que nem havia sido liberada pela censura ainda, para surpresa geral. E fez ainda um discurso que aumentaria a carga emotiva da canção: “Essa música, eu peço permissão a vocês, porque eu dediquei ao meu filho, esperando que no futuro ele não encontre nunca aqueles problemas que eu encontrei, e tenho às vezes encontrado, apesar de me chamar Wilson Simonal de Castro”. Um discurso bastante atual.
Para João Santana, Simonal foi claramente uma vítima de racismo velado no Brasil, exilado em seu próprio país, mas sempre teve apoio dos fãs e amigos da cidade de Natal, onde passava longas temporadas. “Enfrentamos muitas coisas juntos e este capítulo da vida de Simonal ainda precisa ser contado”.
Acesse o canal João do Simonal
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