Capa de "Parnamirim" mostra o encontro de Vargas e Roosevelt: "Um romance de inclusão"
Reportagens
Radicada nos EUA, autora brasileira de origens potiguares ressalta importância dos brasileiros em romance histórico sobre a guerra
31 de julho de 2020
Por Cinthia Lopes | Editora e Redatora
Em dezembro de 1941, os americanos chegaram ao Rio Grande do Norte para se instalar em Parnamirim e implementar uma base aérea estratégica de transporte de cargas, para abastecer os aliados durante a II Guerra Mundial. Foram quase cinco anos de movimentação intensa, em meio a uma pacata Natal que assistia curiosa o ir e vir de aviões em Parnamirim Field ou na Rampa, pelo rio Potengi, além da rotina agitada na varanda do Grand Hotel e nas noites da capital e arredores. Estima-se que por aqui passaram cinco mil americanos, entre oficiais, soldados, autoridades e até algumas estrelas de cinema.
Um fato histórico que potiguares e brasileiros já conhecem de cor, mas que a maioria dos norte-americanos nunca nem ouviu falar.
É como se tivessem varrido esse capítulo para debaixo do tapete. Salvo uma ou outra revista de época, esse ‘pouco caso’ despertou questionamentos, e uma ponta de indignação, da escritora brasileira radicada nos Estados Unidos, Valdívia S. Beauchamps. Pernambucana com raízes potiguares, a autora vive há mais de 50 anos em Nova York, onde constituiu família e fez carreira como jornalista, professora e escritora.
A falta de informações aprofundadas na literatura americana sobre o fato histórico fez a escritora tomar para si a missão de resgatar essa participação de heróis e heroínas brasileiras no romance histórico “Parnamirim, Base Norte-americana nos Trópicos – 1939-1945 – uma história inclusiva”. A obra coloca em evidência a participação do Brasil e seus atores no confronto, sobretudo as mulheres que estiveram junto à Força Expedicionária Brasileira (FEB) ressaltando a importância da base norte-americana construída no Rio Grande do Norte.
A costura de ficção a partir de nomes e fatos reais e a pesquisa histórica que consta na obra levou “Parnamirim” a ser indicado ao Prêmio Jabuti na categoria Ensaio.
A autora recebeu esta semana a notícia de sua Publisher no Brasil, da ZL Books, e conversou por telefone sobre a recente indicação, a repercussão após o lançamento e outros detalhes da obra.
“Parnamirim” foi lançado no começo do ano em português e francês, e agora acaba de sair a edição em inglês já disponível na Amazon. Quando estava com viagem marcada para Natal para o lançamento, estourou a crise sanitária da Covid-19.
Valdívia S. Beauchamps mora em Nova York desde os anos 60. Foto: Cedida
“Não pude ir, mas ainda participei do lançamento na Academia de Letras da Grande São Paulo da qual faço parte”, contou. Valdívia está otimista com a repercussão do livro aqui no Brasil e no país onde vive. “Assim que o livro saiu em inglês, comecei a receber cartas e convites para palestras. “O povo americano, que sempre valorizou seus heróis, precisa conhecer melhor a participação de homens e mulheres brasileiros que lutaram bravamente”.
Ela conta que foi uma pesquisa trabalhosa e vai além da ficção histórica. “É uma pesquisa que busca explicar a omissão dos americanos sobre a participação do Brasil e colocando-o no merecido nível dos demais aliados que participaram da Segunda Guerra Mundial”, explicou a autora, que em 2008 veio ao Brasil para lançar outra obra de cunho histórico, sobre a vinda de Dom João VI ao Brasil – “A Napoleão a Culpa”.
Edição em francês do romance histórico "Parnamirim"
O livro
A história é conduzida pela personagem Sarah Paller , uma jornalista nova-iorquina, assim como a autora, apreciadora do presidente Franklin Roosevelt que resolve mergulhar na saga lançando o foco em três questões: o porquê da omissão na literatura acerca da instalação da Base Aérea em Parnamirim; da presença do Brasil na Campanha da Itália; e da atuação das enfermeiras brasileiras como integrantes da FEB. “A protagonista segue expondo as complementaridades das duas culturas em solo brasileiro."
Em sua busca, Sarah conhece veteranos e veteranas de guerra em um evento na Europa. Toma a decisão de vir ao Brasil colher in loco informações na cidade que abrigou a maior base dos americanos fora dos EUA. Em Natal encontra colaboradores de sua empreitada e compartilha novas descobertas. Uma delas ela conta que na província de Lucca, na Itália, existe um festival criado em gratidão aos esforços dos pracinhas brasileiros.
Enfermeiras que atuaram junto as Forças Expedicionárias Brasileiras são foco do romance histórico.
A capa de “Parnamirim” traz a emblemática foto do encontro de Getúlio Vargas com Franklin Roosevelt conhecido como a “Conferência do Rio Potengi”. Já a capa da edição francesa é um hidroavião sobre o rio Potengi.
“Moro na América desde 1964, constitui família, estudei, fiz meu mestrado, casei, tenho minha prole. Então em meados de 2008, com a proximidade de 2020 e os 75 anos da vitória, resolvi trazer à tona esse assunto incrível de caráter internacional. Li muitos livros, pesquisei em bibliotecas, acervos de mídia e colecionadores”, destacou.
Sobre sua relação com o Rio Grande do Norte, Valdívia relembra: “Papai era de Assu, meu avô tinha terras naquela região. São parentes os Cortez, Siqueira e Targino. É tudo família."
Ela diz que o livro é também uma forma de reencontro com suas origens: “Meu marido, João Mendonça de Amorim Filho, foi quem me jogou essa primeira lembrança de escrever sobre a base aérea de Parnamirim”, conta.
Sobre suas conclusões, Valdívia coloca Getúlio Vargas como um aliado que ninguém queria ter muito próximo. “Vargas ficou sem tomar uma decisão por muito tempo, não definia se ficava do lado dos Axis (as potências do Eixo) ou do outro lado e finalmente ele aceitou ficar com Roosevelt e Churchill. O Vargas tinha seus amores pelos nazistas, tinha alemão no Brasil que não acabava mais. Churchill e Roosevelt, como dois estadistas, não quiseram ressaltar essa proximidade com o Brasil, mas tinham interesse e conseguiram o dinheiro para a construção da CSN de Volta Redonda e convenceram Vargas a ceder a base de Parnamirim que era estratégica, o lugar mais perto de Dakar, onde os alemães já estavam”, resume.
Livro da autora está disponível na Amazon e no Nordeste está à venda na Livraria Jaqueira, no Recife.
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