Poema ganha imagens de águas oceânicas de corais, mapas e praias

Agenda Cultural

"Porto Madeiro" faz mergulho poético e imagético sobre ocupação francesa na costa potiguar

 Dácio Galvão experimenta parceria com Cid Campos, Augusto Calçada e Lucila Meirelles em videoclipe

27 de agosto de 2020

Por Cinthia Lopes

Entre as duas águas da antiga aldeia de Tibau do Sul existia um porto onde corsários franceses sonhavam com a França-antártica enquanto saqueavam riquezas e povos, ocupando aquela praia de areias brancas e pedras pretas solitárias. É dessa quase-memória alcançada por afetos e raízes familiares que nasce o poema “Porto do Madeiro”, de Dácio Galvão, agora transformado em música e vídeo-arte numa parceria com o amigo poeta e compositor Cid Campos, a videoartista e performer Lucila Meirelles e o editor Augusto Calçada. O vídeo está sendo lançado nesta quinta-feira (27) nas redes sociais do autor @daciogalvao no Instagram, Facebook e YouTube.

Emoldurado pelo imagético aquático de águas oceânicas, corais e sonoridade idílica, Cid Campos canta os versos dessa epopeia de sol, mar e história: “Franceses, corsários, piratas atracaram, respiraram, curaram tuberculoses, traficaram pau-brasil e com tintas redesenharam portos...”

As sonoridades do fundo do mar se juntam a metáforas e a um corpus vocabular que remete a exploração francesa e suas decorrências. “Um cenário secular vivo onde o tempo aparece parado e sendo o maior testemunho”, descreve Dácio Galvão.

Na parceria, Cid Campos entrou com a composição e interpretação. A direção de videografia é de Lucila Meirelles e Augusto Calçada. O editor conta que procurou fazer uma conexão com o poema “Naufrágio Antigo” de Cecília Meireles, publicado no livro Vaga Música de 1942. “Resultou um delicioso clipe construtivo que refaz mergulhos poéticos na ocupação francesa do RN”, definiu.

Gravado e mixado no MC2 Studio (SP), “Porto do Madeiro” está selecionado no Festival Lift-Off Sessions, do Reino Unido, na categoria vídeos experimentais.

O vídeo experimental também marca o retorno do poeta ao audiovisual, algo que pontuou sua trajetória de forma paralela,  seja com a edição de vídeo dos anos 60/70 aos poemas sonoros e poesia concreta.

Dácio Galvão é autor dos livros “Blues Repartido”, “Palavras, Palavras, Palavras”, “Da Poesia ao Poema” e no ano passado lançou “A poesia Câmara Cascudo: um livro no inferno da biblioteca”. Além dos Cd’s-livros “Poemúsicas1” e “Poemúsicas2”.

O escritor falou sobre o processo de “Porto do Madeiro”. Confira:

Como surgiu a parceria Cid Campos/Dácio/Cecília/Batalha?

Eu e Cid Campos temos uma relação de 15 anos e nesse tempo já trabalhamos juntos em empreitada similares de produção em cima de poemúsica. Escrevi o texto e enviei para ele dar uma olhada, a princípio fazer uma oralização apenas. Quando ele leu, disse que queria dar um tratamento mais musical. Ele disse que faria uma melodia com a marca dele. Cid vem de um trabalho melódico experimental ao musicar os poemas de Emily Dickinson a partir da tradução de Augusto de Campos. Então ele fez uma melodia de um jorro só. Quando vi aquilo achei muito visual e dei um toque pra Lucila, que já trabalhava com Cid em vários trabalhos. Ela foi casada com José Roberto Aguilar e tinha feito Rito do Amor Selvagem que eu curti muito. Então mandei pra ela, que achou o poema bastante imagético e chamou Augusto Calçada que é um craque na edição. Essa convergência não foi planejada, foi surgindo ao longo do processo e ficou muito bacana. A liberdade foi total para Lucila viajar nas imagens, as aplicações de vocábulos que ela joga no meio das imagens.

 “Porto do Madeiro” é um mergulho poético sobre a história de Tibau do Sul?

É um testemunho de um cenário histórico. As imagens marinhas representam o testemunho mudo dessa ocupação francesa e o saqueamento, exclusão, o processo de domínio de povos. Portugal estava aqui e queria expulsar os franceses, então o poema remete ao Porto Madeiro, mas fala sobre qualquer outro porto ou área litorânea, como Maranhão onde a presença francesa foi mais forte.