Carlos Von Sohsten estreia no romance histórico e recebe apoio financeiro no Catarse

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Revolução de 1935 ocorrida em Natal inspira novo romance histórico

“Natal, 1935: Crônica de uma história inacabada”, de Carlos Von Sohsten, reúne personagens ficcionais em diferentes épocas e olhares

07 de julho de 2021

A Intentona Comunista de 1935 é um daqueles acontecimentos históricos improváveis que até hoje instiga a imaginação e o faro investigativo de escritores norte-rio-grandenses. Do romance de ficção histórica e trama mirabolante que mistura humor, amor e traição, o mestre Nei Leandro de Castro adentrou na história com “Dunas Vermelhas''. Antes, Homero Costa já havia escrito “A Insurreição Comunista de 1935”, considerada pelos leitores uma boa fonte de pesquisa sobre o tema. Recentemente, o jornalista Carlos Peixoto nos trouxe “Lendas da Revolução”, ficção histórica a partir da visão de um personagem real. 

Agora está chegando outra obra que traz uma nova perspectiva. Como em um filme,  “Natal, 1935: Crônica de uma história inacabada”, do escritor Carlos Von Sohsten, traz a história sob  ponto de vista de narradores que vivem em tempos diferentes. Há personagens fictícios que se destacam: Heitor Casado, Abel e Chico Bolacha. Heitor Casado, por exemplo, vive no nosso tempo.  Ele é um professor de história e vive com a cabeça em 1935. Sabe tudo sobre o evento. “Procurei construir dessa forma para poder ter diferentes perspectivas sobre os acontecimentos”, disse o autor.

O livro foi colocado para financiamento coletivo no Catarse e já arrecadou quase todo o valor de sua produção. Esta quinta-feira (8) será o último dia para quem quiser apoiar. “Natal, 1935: Crônica de uma história inacabada” preenche os vazios da história real com boas doses de criatividade. O autor justifica como os detalhes da história que ele conheceu através da obra de Homero Costa ”são tão fantásticos, que já parecem por si só uma ficção”, disse. “A denominação do evento também é curiosa. Há quem chame de insurreição comunista, outros de levante antifascita, de intentona, de revolta, de rebelião, e por aí vai. Eu comecei a ler mais sobre o evento e fui percebendo que seria interessante preencher certos “vazios” com ficção. Eu queria viver algumas daquelas coisas na pele dos personagens”, disse Von Sohsten. Confira a entrevista com o autor: 

Por que fazer um romance sobre a Revolução de 1935? 

Quando eu li o livro “A Insurreição Comunista de 1935 - Natal - O Primeiro Ato da Tragédia”, do professor Homero Costa, fiquei impressionado pela forma como tudo se desenrolou em Natal e no RN. A história em si, de detalhes tão fantásticos, já parece por si só uma ficção. Além disso, havia muita coisa sobre as quais até hoje não se tem uma explicação ou que não tem consenso entre os historiadores. A própria denominação do evento: há quem chame de insurreição comunista, outros de levante antifascita, de intentona, de revolta, de rebelião, e por aí vai. Eu comecei a ler mais sobre o evento e fui percebendo que seria interessante preencher certos “vazios” com ficção. Eu queria viver algumas daquelas coisas na pele dos personagens.

Existe uma relação pessoal com o fato histórico?

Quanto à relação pessoal com o fato histórico, diretamente não. Mas meu avô, Hiram de Lima Pereira, foi preso por engano quando explodiu o levante no Rio de Janeiro, que iniciou lá quando o de Natal estava sendo dominado. E foi no período em que esteve preso que meu avô foi apresentado ao comunismo, tendo se tornado um importante membro do partido. Inclusive foi eleito deputado estadual no Rio Grande do Norte, em 1946, mas não chegou a tomar posse, pois o partido foi colocado na ilegalidade logo após as eleições. Na década de 70, no auge da repressão do regime militar que se instalou depois do golpe de 64, meu avô desapareceu. Sabemos que ele foi preso e depois morto pelos militares.

Existem personagens de ficção cujas histórias vão se entrecruzar com personagens que existiram de fato. Quem são essas figuras?

O romance tem múltiplos narradores e personagens. Procurei construir dessa forma para poder ter diferentes perspectivas sobre os acontecimentos. Há três personagens fictícios que se destacam: Heitor Casado, Abel e Chico Bolacha. 

Heitor Casado vive no nosso tempo.  Ele é um professor de história e vive com a cabeça em 1935. Sabe tudo sobre o evento. Um dia, ele tem um encontro inusitado em uma livraria da cidade e recebe novas informações sobre o levante que podem mudar radicalmente a visão que se tem sobre determinados acontecimentos. Pronto! Ele não consegue mais dormir: vai pesquisar tudo o que tem sobre o assunto para tentar entender o que de fato aconteceu.

Abel e Chico Bolacha são personagens da época. Abel é um “colecionador de livros”, boêmio, que adora tomar cerveja, e que está criando aquilo que um dia seria chamado de “sebo”. É uma pessoa sensível que vai sofrer duramente os efeitos de 1935. Chico Bolacha é baseado em um personagem real sobre o qual há diversas interpretações e imensas divergências. Sua história é bastante curiosa… 

Por essa complexa teia que é formada pela história, vários personagens históricos vão transitar ao lado de personagens fictícios, por exemplo, o governador do estado, Rafael Fernandes, o prefeito de Natal, Gentil Ferreira, os membros da Junta Revolucionária, como José Macedo, o sapateiro José Praxedes, entre outros.

No livro, existe uma viagem no tempo real ou está só na cabeça do personagem?

No romance, ficção e história caminham lado a lado. Nessa edição especial que estamos fazendo pelo Catarse, haverá uma seção com “Comentários do Autor” em que eu vou esclarecer tudo o que foi inventado por mim. O restante, por mais incrível que possa parecer, aconteceu de fato.

Por que você considera essa insurreição uma história inacabada? 

Na verdade, eu considero que a história em si nunca se acaba. Estamos sempre vivendo e atravessando processos históricos que possuem algum tipo de relação com acontecimentos passados. É uma visão dialética e bastante enriquecedora para entender muito do que vivemos.

A campanha no Cartase tem te surpreendido? 

Antes da pandemia, o livro estava com uma editora especializada em romances históricos que iria publicá-lo. Porém, com a crise instalada, muitas editoras tiveram que cancelar projetos. Eu queria muito publicar logo o livro, pois sofro de um bloqueio criativo que aflige muitos escritores: não consigo produzir um novo livro enquanto o anterior não está publicado. A alternativa foi o financiamento coletivo através do Catarse, que é um caminho bastante comum atualmente para escritores iniciantes e que ainda não têm um grande público cativo.

Eu considero que a campanha do Catarse foi um sucesso! Fiquem bem surpreso com os resultados. Batemos a meta principal na primeira semana!!! E estamos bem perto de atingir 175% da meta. Essa primeira edição vai ter uma tiragem de 500 livros.

Natal e o RN tem histórias que precisam ser contadas. O que daria outra boa história ou romance histórico?

Eu diria que é quase um universo infinito (risos). Por exemplo, o período da segunda guerra mundial. Pelo envolvimento de Natal e Parnamirim nesse episódio, é um período bastante rico em detalhes e possibilidades. Já existem alguns livros de autores locais que exploram esse período. Por exemplo, o livro de Lenilson Antunes, “Parnamirim Field - Último pouso”.

Mas, é possível pensar em histórias que sejam ligadas a momentos sobre os quais pouco se fala, por exemplo, o período da cultura do algodão. Ou histórias ligadas a determinados prédios históricos ou corporações. Ou ainda, biografias. No meu primeiro livro de ficção, por exemplo, o conto “O Escritor”, eu sigo a história de uma importante personalidade local, trazendo ao conhecimento do leitor detalhes sobre sua vida que são poucos conhecidos.


Muitos historiadores abordam a Intentona comunista de 1935. Quais deles serviram de base/fonte de pesquisa? 

Sim! Há muitos livros sobre o episódio. Eu pesquisei e li muita coisa para poder criar um romance, com o máximo cuidado para não distorcer a História, nem envolver personagens históricos em situações indevidas. Acho muito importante ter a percepção que história é coisa séria. A distorção da história (muito se fala sobre as fake news, mas tão grave quanto elas são as fake stories) pode trazer sérias consequências. Embora o livro tenha passagens divertidas, leves, eu levo muito a sério o material com o qual estou lidando. Eu sempre preservava em minha mente que o episódio impactou a vida e a morte de muitas pessoas.

Gostaria de acrescentar também que apesar de ter pesquisado e lido muito sobre o episódio, eu não sou um especialista no assunto, nem muito menos um historiador. Estou muito longe disso. Registro inclusive minha imensa admiração pelos historiadores. Ao final do livro, eu destaco diversas referências que me serviram de base, tanto livros quanto documentários. Contudo, eu destacaria dois livros que foram muito importantes: “A insurreição comunista de 1935: Natal, o primeiro ato da tragédia”, de Homero Costa, e “Luiz Carlos Prestes: um comunista brasileiro”, de Anita Leocadia Prestes. Anita e Homero, inclusive, tiveram acesso ao primeiro esboço do livro e fizeram uma revisão técnica, “passaram o pento fino”, eu digo, de forma a me dar segurança de que eu não cometia nenhuma impropriedade com fatos e personagens.