Ana Morena Tavares, minha filha roqueira
Colunas
E eu, que gosto tanto do silêncio, abro uma exceção e digo: aumenta o som que é rock and roll!
13 de julho de 2022
Clotilde Tavares
Nesta semana, comemoramos o Dia Mundial do Rock.
A história da efeméride nos leva de volta ao dia 13 de julho de 1985, no festival Live Aid, um evento simultâneo ocorrido em Londres e na Filadélfia, Estados Unidos, para arrecadar fundos com o objetivo de mitigar a crise humanitária na Etiópia. À frente de 1,5 bilhão de espectadores, que viam o evento pela TV em várias partes do mundo, o baterista Phil Collins sugeriu que nesta data, a cada ano, se comemorasse o Dia Mundial do Rock. Mas para quem gosta, todo dia é dia de rock.
Gosto de dizer que o rock and roll tem a minha idade, embora saiba que ele é alguns anos mais novo. Desde os meus 10, 12 anos de idade que ele faz parte da minha vida, chegando primeiro pela música, depois pelo cinema. Hoje, já setentona, constato divertida que acabou o sexo, acabaram as drogas, mas permanece o rock and roll.
No início da década de 1950, a galera já se balançava e girava ao som do rhythm & blues. Aí um disc-jockey chamado Allan Freed se autointitulou “Moondog” e, através de um programa de rádio e da organização de bailes, deixou sua assinatura na música mundial, criando em 1954 o termo “rock and roll” para designar o novo ritmo, que veio a se tornar mais do que uma dança: virou uma atitude, que mudou a face do comportamento entre os jovens.
Eu tinha sete anos em 1954 e aos doze, em 1959, a música ia chegando devagarinho, pelas ondas do rádio, primeiro na voz comportadinha de Celly Campello com o seu Estúpido Cupido, e o bom mocismo de Sérgio Murilo cantando Broto Legal; mas também rolavam sons mais sensuais e esquisitos, com Little Richard com Long Tall Sally e Tutti Frutti, e Chuck Berry com Johnny B. Goode.
Mas o rock não era só a música. Também havia a dança que aprendíamos no cinema, em filmes que passavam sempre nas sessões das dez horas da manhã do domingo no cine Capitólio, na minha tão querida e provinciana Campina Grande. Eram filmes toscos, simplistas, com roteiro precário, cujo único objetivo era veicular os artistas das gravadoras que financiavam a aventura, capitaneados pelo já referido Alan Freed. O cinema lotado de adolescentes aos gritos, alguns se atrevendo no corredor entre as poltronas para ensaiar os passos, no escuro mesmo, ameaçados de expulsão o tempo todo pelos lanterninhas. Uma festa!
Aos doze anos eu já saía da aula mais cedo e, escondido de Mamãe, ia dançar rock na casa de um pessoal, na esquina da rua Irineu Joffily com a praça Cel. Antonio Pessoa. Eu morava na Miguel Couto; dali ao centro da cidade eram uns 600 metros, em linha reta, e aquele trajeto eu fazia para ir ao colégio, ao cinema, mas era também o mesmo percurso que os adultos da casa faziam para ir e voltar ao trabalho. Na casa de janelas abertas sobre a praça, em uma tarde de excepcional performance, fui vista por Titia, que vinha do trabalho. Ao chegar em casa, ela informou a Mamãe o tenebroso fato: “Ela estava escanchada na cintura de um rapaz!”
Quando cheguei em casa, Mamãe me fez shake, rattle and roll ao aplicar nas minhas costas e onde batesse umas lamboradas com um artefato de psicologia maternal inventado por ela e que consistia numa corda de sisal trançada com uma velha tomada de ferro elétrico e mais uma tira fina de couro, para ajudar no peso e no balanço.
Talvez tenha sido por isso que o rock and roll se incrustou na minha pele e nunca mais saiu, numa espécie de tatoo comportamental de tal forma indelével que até hoje, mais de sessenta anos depois dos eventos descritos, ainda continuo fã e praticante, do ritmo e da atitude. Não pratico mais a parte acrobática da dança; mas o resto tudinho eu ainda faço.
Meus filhos não precisaram apanhar para aprender a gostar de rock. Ambos roqueiros, fazem do ritmo e atitude o pão de cada dia: Rômulo, guitarrista, com a Banda Alfândega em sua formação original há mais de 30 anos; e Ana Morena, que é empresária de música e baixista de bandas em Natal, à frente de projetos agregadores e consolidados, como o Festival DoSol.
Música, dança, atitude: o rock representa, principalmente, liberdade. Mas é também coragem de contestar, de ir contra o establishment, contra a caretice, contra a hipocrisia, contra tudo aquilo que trava e limita a criatividade. O rock está na linha de frente da luta pela justiça, pelos direitos humanos, pela conservação da natureza. O rock é bravo, é potente, e também é uma canção de amor.
E eu, que gosto tanto do silêncio, abro uma exceção e digo: aumenta o som que é rock and roll!
http://linktr.ee/ClotildeTavares clotilde.sc.tavares@gmail.com
- Don’t knock the rock (1956) - https://youtu.be/MUmGkiC8oa0
Filme com Alan Freed, com performances by Bill Haley & His Comets, Little Richard, e outros.
- Rock rock rock - https://youtu.be/t1GmNhxnEck
Mais um filme de Alan Freed com Chuck Berry aos 23 minutos.
A gente enlouquecia no cinema no final dos anos 1950!
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